Os Estágios Internacionais de Actores Lusófonos constituem uma das iniciativas mais importantes da Cena Lusófona. Com o objectivo de aprofundar a formação de jovens actores da CPLP em áreas específicas, este terceiro estágio surgiu como um momento de confronto de conhecimentos e experiências em que pessoas de diferentes latitudes tiveram a oportunidade de multiplicar as suas ligações e partilhar o seu saber teatral. Os Estágios são também locais privilegiados de constituição e elaboração de projectos de construção conjunta que implicam um sempre renovado teste à possibilidade de entendimento artístico e humano entre pessoas tão diferentes que, no entanto, possuem pontos de partida comuns: a possibilidade de comunicar numa mesma língua, o amor ao teatro e a decisão de se expressarem através dessa forma artística.
A maioria dos estagiários já participou em outras acções de intercâmbio ou pertencem a grupos que desenvolveram colaboração regular na rede da Cena Lusófona. Neste Estágio, à excepção de Moçambique e Timor, todos os outros países estiveram representados.
Procurou-se este ano, na oportunidade das parcerias da Coimbra 2003 Capital Nacional da Cultura e d´A Escola da Noite, um novo figurino para o III Estágio Internacional de Actores. Desta vez, a organização executiva ficou a cargo de uma companhia de teatro e desenvolveu-se a partir do seu modelo de trabalho concreto, do seu núcleo de formadores e das suas equipas organizativa e técnica.
Pela primeira vez, o plano do estágio consistiu essencialmente na inclusão dos actores nas actividades normais de uma companhia de teatro profissional, que funcionou ao mesmo tempo como instituição de acolhimento e entidade formadora. Foi proporcionado aos estagiários o contacto directo com as diferentes valências de uma estrutura deste tipo – actuação, encenação, dramaturgia, cenografia, figurinos, técnica de palco, produção e gestão – tanto através da realização de pequenos worshops temáticos como, sobretudo, pelo acompanhamento diário do trabalho que vais sendo desenvolvido. Na área especifica do trabalho do actor, destacam-se ainda o estágio de três dias organizado pelo grupo de teatro O Bando, sob a direcção de João Brites, Teresa Lima e Luca Aprea, bem como o exercício dirigido por António Mercado, durante três semanas, apresentado aos participantes do Congresso Internacional de Literaturas Africanas “ Cinco Povos, Cinco Nações” (organizado pela faculdade de Letras da UC).
A fase final do estágio consistiu na construção do espectáculo “O Horácio”, de Heiner Müller, que estreou na Oficina Municipal do Teatro a 28 de Novembro. Dirigido por Pierre Voltz, encenador francês com larga experiência também no campo da formação de jovens actores, o processo de montagem deste espectáculo foi ainda aproveitado para desenvolver outras acções de formação no campo da dramaturgia (com Carlos Guimarães, especialista na obra de Müller) e da preparação do actor, com os contributos de António Amorim e de Frank Manzoni. Depois da temporada em Coimbra (até 6 de Dezembro), “O Horácio” foi igualmente apresentado em Aveiro.
o horácio
de Heiner Müller
Tito Lívio relata como o Romano Horácio mata o Albano Curiácio numa guerra que assegura a vitória de Roma e como, uma vez vencedor, reencontra a sua Irmã, noiva do Curiácio: porque ela, no seu sofrimento, amaldiçoa Roma, ele, por sua vez, mata-a. Começa então o processo daquele que é, ao mesmo tempo, um herói e um assassino, processo no fim do qual a eloquência do Pai de Horácio obtém a absolvição do filho.
Heiner Müller recupera esta história mas modifica-lhe o final: os que defendem o vencedor e os que atacam o assassino batem-se entre si e as suas posições simplistas levam à guerra civil. Face ao inimigo exterior (os Etruscos), a sua sobrevivência exige uma solução unânime. O povo decide, então, que Horácio deverá ser, simultaneamente, honrado como vencedor e executado como assassino. O que se leva a cabo (contrariamente à tradição de Tito Lívio recuperada na tragédia francesa de Corneille…) com a minúcia de um ritual que permite a reflexão sobre as relações entre o individual e o colectivo, sobre a verdade necessariamente “impura”, sobre o lugar da “palavra” na história do mundo…
Heiner Müller escreveu um texto curto, na linha das Lehrstücke (peça de aprendizagem) de Brecht, onde o rigor lógico e a densidade poética dão uma força singular à meditação política.
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Amélia da Silva (Guiné-Bissau) |
Andrea Pozzi (Brasil) |
Carla Sequeira (Cabo Verde) |
Carlos Marques (Portugal) |
Célsio Gaspar (S. Tomé e Príncipe) |
Érico Brás (Brasil) |
João Ricardo (Brasil) |
Margarida Dias (Portugal) |
Marta Gonçalves (Portugal) |
Ricardo Correia (Portugal) |
Sílvia Brito(Portugal) |
Sofia Lobo (Portugal) |
Virgílio António (Angola) |
ficha técnica
encenação Pierre Voltz
tradução Anabela Mendes
elenco Amélia da Silva, Andrea Pozzi, Carla Sequeira, Carlos Marques, Célcio Gaspar, Érico Brás, João Ricardo, Margarida Dias, Marta Gorgulho, Ricardo Correia, Sílvia Brito, Sofia Lobo e Virgílio António
movimento Franck Manzoni
cenografia e adereços António Jorge
figurinos Ana Rosa Assunção
desenho de luz Elias Macovela
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